O que um dia parecia pertencer ao reino da ficção científica distópica, agora se manifesta como uma realidade inquietante: a iminente ameaça à privacidade de nossos pensamentos. As empresas podem ter acesso ao que pensamos e desejamos? Saiba a verdade.
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Nita Farahany, uma respeitada pesquisadora e professora da Universidade Duke, nos Estados Unidos, alerta para essa realidade emergente e nos instiga a considerar o “direito à liberdade cognitiva” como uma atualização crucial das noções tradicionais de privacidade, especialmente quando se trata de proteger os nossos dados extraídos de atividades cerebrais.
Em seu livro recentemente lançado, intitulado como “The Battle for your Brain: Defending the Right to Think Freely in the Age of Neurotechnology”, que é (“A Batalha pelo seu Cérebro: Defendendo o Direito de Pensar Livremente na Era da Neurotecnologia”), Farahany mergulha nas complexidades éticas e tecnológicas da era da neurotecnologia.
Como exatamente as firmas estão começando a ler as nossas mentes?
Coleta massiva de dados por empresas
A resposta, surpreendentemente, não envolve uma máquina que acessa diretamente os nossos pensamentos, como vemos na ficção. Em vez disso, as defesas da nossa segurança de pensamento começaram a desmoronar graças à coleta massiva de dados pessoais em redes sociais e aplicativos.
Esses dados são analisados por algoritmos e usados para criar perfis detalhados sobre quem somos, nossas preferências e desejos. Hoje, as empresas de tecnologia têm informações cruciais sobre nós, desde os nossos círculos sociais até as preferências políticas, os nossos hábitos de consumo e até mesmo às nossas transações financeiras.
Tudo isso é usado para criar perfis precisos que ajudam as empresas a entender os nossos comportamentos e desejos. Como Farahany adverte: “É importante as pessoas entenderem que elas já estão em um mundo onde mentes são lidas”.
Além disso, a popularização dos smartwatches e outros dispositivos de monitoramento de saúde está levando a uma nova fronteira na coleta de dados sobre o nosso funcionamento interno; no entanto, a verdadeira revolução está acontecendo com o avanço da neurotecnologia, que utiliza sensores cerebrais para captar a atividade elétrica em nossos cérebros. Esses sensores, que se assemelham aos sensores de frequência cardíaca em smartwatches, podem decodificar padrões de atividade cerebral associados a nossas emoções e pensamentos.
Esta é a essência da preocupação de Farahany: os nossos pensamentos e emoções estão se tornando cada vez mais acessíveis a terceiros. Ela argumenta que as pessoas precisam entender que os seus cérebros não são inteiramente seus, especialmente com a proliferação de tecnologias que buscam influenciar e moldar as nossas ações e pensamentos.
Um exemplo disso são os algoritmos projetados para nos manter conectados às redes sociais, notificações que nos mantêm no celular e até mesmo a reprodução automática de episódios em serviços de streaming. Estas são ferramentas projetadas para influenciar as nossas escolhas, levantando questões sobre o livre arbítrio.
Farahany não é contrária à neurotecnologia. Ela acredita que pode ser uma força para o bem, se utilizada de maneira ética e responsável. A chave, segundo ela, é encontrar um equilíbrio entre os benefícios da tecnologia e a proteção contra o seu uso indevido.
A falta de regulamentação eficaz é uma preocupação real. A tecnologia está avançando mais rapidamente do que a legislação. O debate ético pode acompanhar, mas estaá deixando lacunas que podem ser exploradas por empresas e governos. Em particular, Farahany enfatiza a necessidade de reconhecer o “direito à liberdade cognitiva”, um direito que protege a nossa privacidade mental e a nossa capacidade de pensar e sentir sem interferência externa.
Ela argumenta que as Nações Unidas devem considerar seriamente a inclusão desse direito em sua declaração de direitos humanos, como uma atualização necessária para a era da neurotecnologia.
Em resumo, enquanto a neurotecnologia promete avanços notáveis, também traz preocupações significativas sobre privacidade e autonomia. O desafio é encontrar um equilíbrio que permita o progresso tecnológico, mas ao mesmo tempo em que proteja os nossos direitos fundamentais de pensar e de sentir livremente.
Conforme nós navegamos nesse novo território, é imperativo que consideremos as implicações éticas e legais da neurotecnologia e trabalhemos para garantir que os nossos pensamentos permaneçam privados e inacessíveis a terceiros não autorizados.