A startup RD Ads utiliza dados do banco da rede de farmácias RaiaDrogasil para direcionar melhor os anúncios aos clientes e, é claro, ganhar dinheiro. Cerca de 48 milhões de pessoas têm suas informações usadas pela empresa para lucrar.
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O sistema permite que o estabelecimento colha informações como idade e sexo, produtos comprados, perfil de gastos e até seu dia preferido para fazer compras. Filtrando tudo isso, é possível encontrar diferentes perfis e impactar o comprador com conteúdos mais diretos e precisos.
“Identificamos as cestas [de compras] daqueles clientes que possuem problemas cardiovasculares, diabetes, colesterol e outras patologias, além de itens como fraldas geriátricas e curativos para ajudá-los com o melhor tratamento”, explica a RD Ads.
O anunciante contrata a RD Ads, informa o público que quer atingir, recebe os dados que precisa e faz a propaganda. O consumidor é redirecionado ao site, redes sociais ou YouTube da farmácia.
Um dos relatos mais ilustrativos dessa operação são os produtos para bebês. A empresa consegue identificar casais com filhos de até dois anos por meio da compra de “fraldas, papinhas e produtos correlacionados”. Ao direcionar a propaganda a eles, as vendas da rede dispararam 20%.
“Os clientes podem ser encarados como audiências […]. [A empresa] pode passar a vender mídia para esse bloco de clientes, concorrendo pelo bolo de investimento publicitário com Google, Meta”, explica Vitor Bertoncini, CEO da RD Ads.
CPF na nota
Basicamente, quem fornece o CPF na hora da compra revela suas doenças, sua frequência sexual, se já engravidou ou tem filhos e até se tem caspa, chulé ou frieira. Tudo isso com base nos produtos comprados, que ficam atrelados ao cadastro.
Segundo a RaiaDrogasil, os clientes que informam o documento no ato da compra autorizam o uso de suas informações. Mas será que eles sabem disso?
Em entrevista recente, o próprio CEO da RD Ads, Vitor Bertoncini, demonstrou como a prática é obscura. “Se você perguntasse o social number nos Estados Unidos, acho que iam chamar a polícia. Aqui, 97% dão o CPF para ter um desconto na farmácia”, disse.
Isso é permitido por lei?
A utilização desses dados ainda está na zona cinzenta da lei, onde ainda não existe regulação e fiscalização. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) considera informações de saúde “dados sensíveis”, segmento que necessita de maior proteção.
Segundo a legislação, o compartilhamento dessas informações para ganhar alguma vantagem econômica “poderá ser objeto de vedação ou de regulamentação”.
A RaiaDrogasil afirma que os dados se tornam anônimos antes de serem usados nos anúncios. Enquanto isso, milhões de CPFs continuam alimentando bancos de dados e revelando informações privadas sobre saúde, reprodução e comportamento sexual.
Enquanto não a regulamentação não chega, uma possível saída é pedir às farmácias que apaguem todos os dados armazenados sobre você. Essa prerrogativa está prevista na LGPD.