Em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou que juízes não devem solicitar a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ou do passaporte como meio para obrigar o pagamento de dívidas. Segundo com a procuradora, a liberdade do cidadão não pode ser confundido com o patrimônio e com propriedades de bem.
De acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), a apreensão dos documentos é considerada inconstitucional por ferir o direito fundamental do cidadão, como o de ir e vir. Assim, essas liberdades não estariam a alcance da decisão do juiz em caso de uma ação patrimonial, como pagamento de dívidas.
Essas medidas passaram a ser mais comuns desde a aprovação do novo Código de Processo Civil (CPC) em 2015. Nele, há a possibilidade do juiz determinar as medidas atípicas em processos de execução, desde que fundamentem os motivos para tal decisão. As medidas atípicas são medidas que nem sempre possuem previsão em lei.
Para Dodge, o novo CPC permitiu que juízes tomassem decisões novas até então, como a apreensão da CNH e do passaporte. Outras medidas que estão sendo tomadas baseadas no novo CPC são a provação do direito de dirigir e a proibição da participação em concursos públicos.
Casos no Superior Tribunal de Justiça
Alguns casos que envolvem o pedido de retenção do passaporte e da CNH chegam ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os ministros consideram que a apreensão dos documentos não pode ser considerada legal em si, porém que deve ser adequada de acordo com a análise de cada caso.
O caso mais recente que resultou na aplicação da medida foi realizada por um juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e confirmada pela Terceira Turma do STJ. A causa foi aberta em 2008 com o valor inicial de R$ 54 mil, fato que resultou na apreensão do passaporte e da CNH do devedor.
Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, não houve ilegalidade na apreensão dos documentos. Para ela, há a possibilidade de reversão da decisão, desde que o devedor apresente uma nova solução para o pagamento da dívida.
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Juiz deve priorizar cobrança por meio do patrimônio
De acordo com a Procuradoria Geral da República, mesmo que o novo CPC autorize a realização de medidas atípicas, os juízes devem priorizar o campo patrimonial, devendo deixar de lado as medidas que afetem a liberdade do cidadão.
Para a PGR, a liberdade do indivíduo não está disponível nem para o credor e nem ao Estado-juiz para a cobrança de direitos patrimoniais. Assim, a cobrança deve ser realizada fora dos direitos fundamentais, de modo a estabelecer limites ao poder estatal, mesmo com pretensões legítimas em julgamento.
Em pedido ao STF, Raquel Dodge solicita que as medidas que envolvam a apreensão dos documentos e a proibição de participação em concursos sejam consideradas como inconstitucionais. A solicitação foi enviada como uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI), aberta pelo PT e tendo como relator do caso o ministro Luiz Fux.